Autos-de-fé
Os autos de fé ocorriam várias vezes por ano, executando-se em alguns deles dezenas de vítimas da inquisição. Os párocos advertiam desse acontecimento os paroquianos com um mês de antecedência, convidando-os a participarem nele e prometendo aos que lá fossem uma indulgência de 40 dias.
Nas vésperas dos autos-de-fé, a cidade era ornamentada com bandeiras e grinaldas de flores, as varandas cobriam-se de tapetes. Na praça central colocava-se um tablado, no qual se erguia um altar sob um dossel vermelho e palcos para o rei ou o governador local e outros notáveis laicos (incluindo os militares) e eclesiásticos.
Nas vésperas realizavam-se uma espécie de ensaio geral do auto-de-fé.
Pelas ruas principais da cidade desfilava uma procissão de paroquianos levando á frente membros da congregação de S. Pedro Mártir (inquisidor dominicano italiano).
Essa confraria encarregava-se de preparar o auto-de-fé: construir o tablado, instalar o “local de trabalho” (“a fogueira”), onde se entregavam às chamas os hereges impenitentes, etc. Seguia-se-lhes todo o pessoal local da inquisição, com o seus denunciantes e confidentes envergando capuchos brancos e trajes corridos, para que as pessoas não os pudessem identificar.
De madrugada, o cárcere da inquisição parecia uma colmeia excitada. Os reclusos não tinham a menor ideia do que os esperava, qual o castigo que lhes tinha sido imposto; e este era-lhes dado a conhecer só durante o auto-de-fé. Os carcereiros preparavam os condenados para a execução, cortando-lhes o cabelo, barbeando-os e vestindo-lhes roupa limpa, era-lhes oferecida uma boa refeição e, por vezes, um copo de vinho.
Punha-se-lhes um baraço ao pescoço e uma vela verde (a cor verde simbolizava a inquisição) nas suas mãos atadas. Os hereges considerados como os mais perigosos eram montados num burro, voltados para trás e atados ao animal.
Seguindo as indicações dos clérigos, muitos lançavam injúrias aos condenados, mas estava-lhes proibido atirar com quaisquer objectos porque podiam aleijar não só os hereges mas também os seus acompanhantes, soldados da “milícia de Cristo”.
A missa de defuntos começava seguida por uma furibunda prédica do inquisidor, após o que se passava à leitura das sentenças. Estas começavam por citações da Bíblia e das obras dos fundadores da igreja eram lidas, lentamente, em latim.
A fogueira encontrava-se numa praça próxima para onde seguiam, após os condenados, as autoridades eclesiásticas e seculares, bem como toda a multidão.
Os verdugos procuravam preparar a fogueira de modo a que consumisse a vítima sem deixar vestígios, mas em alguns casos não conseguiam. Então, destroçavam os restos carbonizados, convertendo-os em pedaços pequenos, trituravam os ossos e atiravam para o fogo novamente essa mistura horripilante. As cinzas eram recolhidas cuidadosamente e atiradas ao rio. Os inquisidores pretendiam impedir deste modos que os hereges levassem os restos dos seus mártires para serem adorados.
O Santo Oficio servia-se também da fogueira para destruir as obras dos apóstatas, os heterodoxos e dos escritores indesejáveis para a Igreja. Faziam-se destruições implacáveis do Corão e do Talmude. Entre as vítimas do Santo Oficio existiam pessoas inocentes mas Nicolau Eymerico acrescentava que “ um inocente condenado inocentemente não deve queixar-se da sentença da igreja, que ditou o seu veredicto com base em provas suficientes e não pode penetrar nos corações; se a condenação se deve, em parte, a testemunhos falsos, é obrigado a aceitar a sentença com resignação, alegrando-se pelo facto de lhe caber em sorte morrer pela verdade”
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